Nos tempos da Panair

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Maior e inesquecível empresa brasileira que teve, até agora insuperável, o mais abrangente número de rotas internacionais e nacionais, com modernização de sua frota frequentemente. Do Catalina (um maravilhoso hidroavião), único meio para atender o interior da Amazônia com rapidez, aos DC-3, onde haviam campos de pouso. Seu concorrente era, em alguns lugares, o Correio Aéreo Nacional, feitos pelos C45/47, da FAB (denominação militar para os DCs) que também prestaram relevantes serviços na Amazônia.

Evidente, havia subvenção do Governo, em cerca de alguns milhões de dólares, mas, como sempre, problemas econômicos e o enfraquecimento de nossa moeda, uma praga que não desiste do Brasil, a subvenção foi extinta, encarecendo os preços das passagens aéreas e reduzindo rotas. A Panair entrou em estado pré-falimentar. Executou demissão de milhares de funcionários, com recurso do seu caixa, com indenizações em dobro. O Governo que fez a intervenção não se responsabilizou por esse pagamento. A empresa, para analistas da época, ainda poderia se recuperar, mas interesses políticos – sempre presentes – teriam favorecido a incorporação da empresa aos ativos da VARIG, da mesma forma como teria ocorrido com uma empresa aérea nacional que está pagando na mesma moeda. Enfim, vontades de pessoas influentes, criam facilidades para transferência, incorporação ou vendas de empresas aéreas brasileiras. Executivos vivem bem, e as empresas vivem mal.

Muitas coisas mudaram no Brasil, quando se fala em companhias aéreas. A Panair faliu, como a própria VARIG, mas tratando bem seus passageiros no ar. As de hoje, caminham para esse fim, como diriam alguns indignados passageiros, e só faltam cobrar a água que servem. Não reduziram custos pelo que se denota, aumentaram os valores das passagens e geram promoções aprazadas para utilização, com pagamento à vista, pelo cartão, numa apropriação, penso, indébita, porque se apropriam antecipadamente de valores, por um serviço que o usuário ainda não usou. E continuam com prejuízos cada vez maiores.

Comecei a viajar de avião nos Catalinas da Panair, para o interior do Amazonas, quando voltava de férias à Manaus, para rever familiares, amigos e conhecer o interior do Amazonas essa querida terra que sempre está no coração da gente, embora a Zona Franca não tenha tido essa preocupação de melhorar a qualidade de vida dos conterrâneos. Gerou emprego e renda, mas esqueceu a infraestrutura, entre outras coisas básicas para uma cidade melhor. Trouxe muitos benefícios para parte da Amazônia ocidental, compreendendo as regiões de fronteiras (Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia), mas não acompanharam a demanda de serviços, políticas públicas saudáveis, etc.

Quando fui estudar na extinta Guanabara (hoje Rio de Janeiro), os momentos eram outros, muito mais românticos, alegres e sem preconceitos, alguns enrustidos, mas uma cidade boa de se viver. Praias, com trombadinhas que tinham medo do guarda, sem a sujeira dos esgotos despejados no mar. Muitos cinemas, muito teatro com peças da melhor qualidade, o Lalaw (Stanislaw Ponte Preta ou Sérgio Porto) com “suas certinhas” de mulheres bonitas na sua coluna, publicada no jornal Última Hora, de Samuel Wainer. A Tribuna da Imprensa, do combativo Carlos Lacerda (e depois Hélio Fernandes) e os Jornal do Brasil, da Condessa Pereira Carneiro, que ditou uma frase “a ordem é não parar”, quando ficou viúva do Conde Pereira Carneiro (e, enquanto viveu, o JB não parou), mas foi vítima de um planejamento que o levou a dificuldades financeiras, quando transferiu sua sede da Avenida Rio Branco para um enorme prédio da Avenida Brasil, e “O Globo” de Irineu Marinho, herdado por Roberto Marinho, entre outros jornais, alguns, não menos importantes.

Fui durante uns cinco anos representante comercial autônomo do JB, no Acre. Nessa época a região não dispunha de recursos para grandes e valorosas propagandas institucionais. Nem grandes empresas ainda existem. Disse que deixaria a representação, e nada reclamei. Um dia, passei no Banco, e na minha conta, um valor expressivo à minha disposição, com todos os direitos e bônus oferecidos pelo JB. Esse era o JB. Tive bons amigos, jornalistas, chefes de sucursal, etc. Alguns ainda os tenho. Outros se perderam no tempo.

Antes dessa história, garotão de 13/14 anos, fui para o Rio, saindo do Aeroporto de Ponta Pelada, em Manaus, num moderníssimo jato Caravelle, da Panair. O tratamento oferecido pelas aeromoças era diferente. Havia uma preocupação natural com os passageiros. O Senhor está bem servido? Alguma coisa a mais? Aceita café? Cerveja? Whisky? Campari, refrigerante? Carne ou frango? Talheres bonitos que alguns levavam para sua coleção (acreditem, eu sempre pedia do pessoal de bordo), belos cobertores, etc. Era assim, principalmente para quem enfrentaria umas cinco horas de vôo, dependendo do equipamento na rota Manaus-Guanabara. E dependendo da hora, café, lanche e almoço ou janta. Mas um atendimento excepcional por belas aeromoças, algumas coroas antigas, sempre belas e atenciosas. Pareciam gostar da profissão. Não esqueço o Constellation no qual cumpri minhas rotas de férias, sagradas.

Hoje as coisas mudaram. Tratamento programado. Senhooooorrr, aperte o cinto; Senhooooor não servimos refrigerantes; Senhooooooorrr, já vamos pousar; um tal de Senhooooorr para tudo. Certa vez, na minha frente, ainda no aeroporto, um passageiro reclamou da falta de informações concretas sobre horário e constante mudanças de portão de embarque, meio aborrecido, teve a seguinte resposta: Senhoooooooor, meu salário não compensa ouvir seus aborrecimentos. A Panair não existia mais.

Do velho Galeão até a cidade, uma viagem tranquila pela Avenida Brasil, sem qualquer preocupação com assaltos e com a violência como acontece hoje. O maior bandido era o Cara de Cavalo e o Mineirinho, os mais conhecidos, além da madame Satã. Olha o guarda! olha o padre! esse é juiz! Havia respeito. Hoje é assim: É um policial! Mata logo.

Ainda escreverei outras coisas sobre os tempos da Panair. Há muito para se contar, até mesmo sobre as mentiras que se justificou para uma intervenção. E também sobre um Estado da Guanabara tranquilo, sem trombadinhas, balas perdidas, com seus românticos bondes ou trailers elétricos, com doido barulho nos freios, os chifrudos, denominados pelos cariocas. Como nada é perfeito, haviam as pavorosas lotações, em alta velocidades que circulavam do centro ao Leblon, voltando pela estreita mas bela e transitável Nossa Senhora de Copacabana. Não havia ali Macdonald, mas o Bobs, empresa genuinamente brasileira na época, já estava por lá.***

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