A Assembleia Legislativa, após aprovar em Plenário requerimento dos deputados Maurão de Carvalho (PMDB), Jesuíno Boabaid (PMN) e demais parlamentares que compõem a Frente Parlamentar Permanente destinada a viabilizar soluções aos desabrigados das enchentes do rio Madeira, realizou nesta quarta-feira (14) audiência pública para discutir projeto de lei complementar que dispõe sobre o aumento das cotas das barragens da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio.
O ato contou com participação de autoridades e representantes de diversos órgãos, entidades e empresas, entre elas a Santo Antônio Energia, OAB, Sedam, Defesa Civil, Corpo de Bombeiros, Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Caerd, além de associações e líderes comunitários de regiões ribeirinhas.
O deputado Jesuíno Boabaid (PMN), que presidiu a audiência, criticou a ausência de representantes do Ministério Público Federal e da administração municipal.
Boabaid lembrou que a audiência foi proposta para tratar o Projeto de Lei nº 102/2016, de autoria do Poder Executivo, que dispõe sobre a exclusão de áreas da Estação Ecológica Estadual Serra Três Irmãos, da Área de Proteção Ambiental Rio Madeira, da Floresta Estadual de Rendimento Sustentado do Rio Vermelho C e da Reserva Extrativista Jacy-Paraná, e destina tais áreas para formação do lago artificial da barragem da Usina de Santo Antônio, para conformação do lago artificial da barragem da hidrelétrica e otimização da geração do potencial elétrico.
João Marcos Dutra, coordenador do MAB, disse considerar desnecessário discutir se a elevação das cotas das barragens irá gerar ou não impactos ou afetar áreas de conservação ambiental quando, segundo ele, o projeto nem foi aprovado. Para Dutra, a discussão deve ser voltada as competências do Ibama, pois cabe ao órgão autorizar ou não o licenciamento ambiental federal para a elevação do Madeira.
O coordenador alegou que a Santo Antônio Energia vem violando uma série de especificações, não cumprindo programas de compensação previstos nas licenças ambientais aprovadas para a instalação inicial da hidrelétrica e que o Ibama não teria tomado qualquer providência. Ele citou a existência de relatórios e estudos que comprovam impactos que vêm prejudicando a saúde de milhares de pessoas, como problemas de contaminação de água.
Representando empresários de Jacy-Paraná, Pedro Simone disse que, com a chegada da Usina de Santo Antônio e com os alagamentos, muitos moradores deixaram o distrito e os empresários foram diretamente atingidos com a queda no comércio local. Segundo ele, muitos prédios foram desvalorizados e os prejuízos foram intermináveis. Ele questionou qual o posicionamento da usina para indenizar os empresários prejudicados.
Moradores do Joana Darc fizeram duras críticas à Usina de Santo Antônio e alegaram pouco caso da empresa em relação aos atingidos pelas enchentes do Madeira. Segundo a maioria, a situação é cada vez mais catastrófica e a população teme por períodos ainda piores caso seja autorizada a elevação da cota das barragens.
O gerente de sustentabilidade da Santo Antônio Energia, Guilherme Abad, apresentou slide de dados e informações que, segundo ele, explicam os motivos da Lei nº 102/2016 ser necessária para o licenciamento do PCCA. Ele relatou os benefícios que, segundo a empresa, serão proporcionados com a ampliação das seis novas turbinas.
Segundo Abad, o aumento da geração trará maior confiabilidade, disponibilidade e estabilidade de energia. Vai integrar a solução para evitar apagões nos sistemas Acre e Rondônia, com fornecimento de 40% da energia consumida em Rondônia e Acre por meio de uma linha de transmissão dedicada.
De acordo com as explicações, a estabilidade energética ajuda a atrair novos empreendimentos para os dois Estados. O aumento da arrecadação de royalties para Rondônia, Porto Velho e União, aumentará de R$ 103 milhões para R$ 117 milhões por ano, sendo 45% para o Estado, 45% para o município e 10% para a União.
O gerente disse que a instalação das seis turbinas não altera o projeto da barragem e garantiu um baixo impacto socioambiental adicional, pois a maior parte dos impactos ocorreram durante a implantação da hidrelétrica e já foram mitigados. Os investimentos socioambientais previstos para a elevação são de R$ 300 milhões, segundo Abad.
O deputado Hermínio Coelho (PDT) criticou a apresentação da Santo Energia e disse que as informações apresentadas não interessam aos atingidos e não dizem nada quanto aos prejuízos que já foram gerados. O deputado disse que a empresa não explica e não resolve nenhum problema e trata com desrespeito os parlamentares da Casa. Hermínio pediu mais clareza e eficiência da empresa e menos informação técnica.
A promotora de Justiça Aidee Maria Mozer, representando o Ministério Público do Estado, afirmou que diante do descumprimento de condicionantes previstas nas licenças de operação e da realidade vivida por milhares de prejudicados em razão dos impactos gerados pela usina, é de extrema urgência o levantamento de novos estudos para que se cogite o aumento da cota das barragens.
Segundo a promotora, a forma como o Ibama realiza suas audiências públicas, sem trazer informações efetivas, deixa a população à mercê apenas do sofrimento que as usinas trouxeram a elas e sem qualquer posicionamento do que de fato está acontecendo e o que ainda pode vir a acontecer.
Disse que foram cometidos inúmeros equívocos em relação às compensações e destacou os problemas apresentados em todos os reassentamentos. Citou o Joana Darc, o qual a promotora disse viver hoje um verdadeiro caos. Ressaltou a queda de qualidade de vida de centenas de famílias e a péssima condição de saúde, uma vez que a chegada de mosquitos antes não existentes na região, tornou a vida das pessoas insuportável.
Aidee disse que, tanto a Santo Antônio Energia quanto os órgãos licenciadores, devem reavaliar a questão de gerar uma energia sustentável, pois isso não estaria sendo cumprido. A promotora também questionou a real necessidade de se gerar energia propondo aumento de cota e se o custo benefício seria realmente vantajoso, levando em consideração a quantidade de impactos e pessoas que serão, novamente, afetadas com os danos que mais uma vez serão gerados.
“Afinal, não há estudos sobre isso. Estamos distantes de relatórios que nos deem garantias, tranquilidade e mostrem quanto tudo isso ainda vai nos custar, pois precisamos de ações de fato mais sustentáveis e menos impactantes. Responsabilizo o Ibama pela falta de esclarecimentos”, concluiu.
Francisco de Sales, secretário da Sedam, disse que quem participou das audiências públicas realizadas pelo Ibama sabe que não teve avanços porque não houve diálogo. Disse que o governo do Estado gostaria de ter avançado mais e ter encontrado denominadores comuns para resolver a situação dos afetados pelas usinas. Afirmou que nas duas oportunidades sentiu a população sem interesse de querer ouvir.
Sales defendeu a elevação das cotas e disse que impactos ambientais já aconteceram no projeto original da usina. Segundo ele, com a instalação das seis turbinas está previsto, após estudos e levantamentos, um impacto de uma área de pouco mais de 600 hectares localizada dentro de unidades de conservação. O secretário da Sedam garantiu que, diante disso, o Estado buscará as compensações desses impactos e indenizará os comprovadamente atingidos.
O comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Luiz Rodrigues, disse concordar que os reassentamentos foram um equívoco e que as pessoas não se sentem mais identificadas com aquelas regiões. Para ele, é preciso uma legislação imediata e evitar deixar chegar a um ponto que seja insustentável. O oficial destacou a necessidade de estudos quanto à elevação da BR 364, uma vez que diante do projeto está previsto o aumento do volume de água do rio Madeira.
O presidente da Comissão de Meio Ambiente e representante da OAB, Anderson Bauers, destacou a importância da discussão e em nome da Ordem, se colocou à disposição da Assembleia Legislativa para a busca de soluções de todos os problemas e questionamentos apresentados na audiência pública.
O deputado Jesuíno Boabaid fez uma série de questionamentos e destacou o problema das compensações socioambientais e o cumprimento de cada uma delas. O parlamentar disse que a audiência foi marcada para esclarecimentos práticos e afirmou que enquanto não tiver todas as suas dúvidas sanadas o projeto em questão, se depender dele, não passará na Assembleia Legislativa.
Segundo o deputado, após todos os debates uma nova reunião será marcada para o próximo dia 5, às 15h, no Plenário da Assembleia Legislativa, como o objetivo de “definitivamente chegar a um acordo que resolva tudo o que foi exposto”.
Fonte: ALE/RO – DECOM