A inclusão de alunos com algum tipo de necessidade especial a sala de aula ainda é um desafio, mas se mostra como o caminho certo para que a escola seja de fato um lugar para todos. Em Rondônia, o número desses alunos inclusos nas escolas estaduais aumenta a cada ano. Saiu de 3.608 em 2012 para 5.204 em 2016.
As gêmeas Thauany Rebeca e Thaíra Vitória Macedo Ferreira, 14 anos, são estudantes do 8º ano da escola estadual Marechal Castelo Branco, em Porto Velho. Elas são cegas, mas enxergam longe e já decidiram o que serão no futuro: jornalistas. ‘‘Eu quero entrevistar as pessoas’’, disse Thauany. Já Thaíra prefere fazer apresentações nos estúdios.
‘‘A sala de recurso como o próprio nome diz ela dá recurso para que a gente possa ser incluída. Ajuda a gente com as tarefas e se enturmar no meio dos colegas. É muito bom’’, disse Thauany explicando que o conteúdo que é passado em sala de aula é transformado em braile pelas professoras da sala de recurso para que ela possa acompanhar os estudos.
A interação com os demais estudantes é outro ponto positivo destacado pelas gêmeas. ‘‘Temos colegas que ajuda muito a gente. São uma mão amiga’’, disse Thaíra afirmando que também recebem muito apoio dos professores.
‘‘Eu apoio a inclusão porque sou uma pessoa que preciso dela. É importante para que as pessoas possam ajudar umas as outras, não olhar para aparência, mas para aquilo que a pessoa pode fazer mesmo sendo deficiente. Com a inclusão nós podemos ajudar muito a nossa sociedade brasileira’’, considera Thaíra.
O que elas aprendem na sala de recurso ajuda não só na sala de aula, mas também no cotidiano. ‘‘Aqui a gente aprende a socializar’’, disse Thaíra.
As estudantes dizem que um dos passatempos preferidos quando estão em casa é entrevistar os familiares. É, falta de socialização não é um problema para as gêmeas, elas se expressão muito bem, estão sempre animadas e dispostas a interagir, mas elas esperam que a sociedade veja a inclusão como uma importante ferramenta de construção coletiva de uma sociedade democrática, um mundo para todos.
‘‘As pessoas ainda têm um certo preconceito. Precisam saber que somos pessoas normais só não conseguimos ver’’, conta Thaíra que também pede para que a sociedade se sensibilize a disponibilizar mais materiais em braile. ‘‘Tenho me empenhado, quero ser alguém na vida e o estudo é essencial. Com fé a gente chega lá’’, disse Thauany.
É o que também acredita o estudante do 6º ano Lucas Marques França, 14 anos. Ele tem dislexia, distúrbio caracterizado pela dificuldade de leitura. ‘‘É difícil para eu ler e aqui na sala de recurso as professoras me ajudam a ler’’. Lucas disse que gosta de artes, educação física e história, mas que quer mesmo é ser médico. ‘‘Eu vi pessoas esperando atendimento no chão, muito doente, isso é muito triste, então eu quero ajudar’’, disse.
Já estudante do 8º ano Erica H. Firmino Medeiros, 22 anos, quer ser nutricionista assim como a mãe. Ela tem síndrome de down e passa pelo processo de alfabetização. ‘‘Aqui eu aprendo a ler, escrever, pintar’’, conta ela empolgada com os avanços na aprendizagem. Ela disse ainda que as disciplinas que mais gosta é ciência, português e inglês.
O estudante Renato Rodrigues da Costa prefere história. Ele quer ser professor dessa disciplina. ‘‘Na sala de recurso tem profissionais experientes para tratar alunos especiais. Quando o professor passa um conteúdo em sala de aula e temos dificuldade, aqui na sala de recurso a gente aprende’’.
Renato acredita que o processo de aprendizagem deve ser compartilhando com todos em um mesmo espaço, independente da necessidade de cada um. Ele apresenta Síndrome de Asperger, um transtorno neurobiológico. ‘‘A gente tem que aprender a aceitar a pessoa do jeito que ela é’’. Ele mesmo é um exemplo que com a convivência as diferenças são superadas. ‘‘Quando cheguei aqui eu brigava muito com outro menino, hoje em dia não brigamos mais’’, conta.
A professora Cerisley Faria Pinheiro, uma das responsáveis pela sala de recurso da escola Castelo Branco pontua os desafios da inclusão social no ambiente escolar. ‘‘Cada criança é diferente e cada deficiência, um desafio, mas tudo começa com a aceitação e todos têm que estar envolvidos para fazer isso acontecer’’.
Ela aponta os impactos positivos do trabalho feito na sala de recursos. ‘‘Tinha aluno que não fazia nada, ficava em sala de aula sem conversar com ninguém e com esse trabalho na sala de recurso eles já conseguem conversar, sair na hora do recreio. A organização em sala de aula também melhora muito’’, afirma.
Braile, informática, ampliação da fonte de prova para alunos com baixa visão, são vários os recursos para tornar o aprendizado mais fácil para esses alunos. Em Rondônia, 319 escolas possuem salas de recursos e 299 foram beneficiadas com o Programa Escola Acessível.
A coordenadora da Educação Especial da Secretaria de Estado da Educação (Seduc), Laura Dantas, explica que as salas de recursos são utilizadas no contraturno onde são desenvolvidas as estratégias que compõem o Atendimento Educacional Especializado (AEE).
‘‘Nesse espaço, o estudante se apropria de ferramentas pedagógicas que ajudam na aprendizagem. Então se é um estudante cego ele vai aprender o braile, surobã que é para o cálculo matemático; orientação em mobilidade e atividade para uma vida autônoma’’, explica.
Enquanto que o Programa Escola Acessível adapta a estrutura física da escola para que o espaço não seja um obstáculo ao estudante. ‘‘A escola adquire recurso através do Censo Escolar que varia de R$ 8 mil a R$ 16 mil para fazer as adequações que necessita’’.
Rampa, alargamento de porta, barras, piso tátil, são algumas modificações necessárias para garantir a mobilidade dos alunos.
Já para os alunos superdotados, também conhecidos como de altas habilidades, o Estado tem investido na robótica. ‘‘Eles também são público na educação especial. Os estudantes neste governo participaram de várias olimpíadas’’, afirma a coordenadora.
Seja a necessidade de direcionar a habilidade acima da média para uma área de interesse, construir rampas para estudantes cadeirantes ou incluir braile na aprendizagem, fato é que as escolas estão avançando para ser de fato um espaço democrático.
Para a coordenadora da Educação Especial, o aumento a cada ano de alunos com alguma necessidade incluídos nas escolas é um reflexo de como o governo, as escolas e a própria sociedade vêm mudando o olhar sobre esse público. ‘‘Falar de inclusão não é fácil, é um processo de transformação’’.
Para ela, é preciso quebrar paradigmas e preconceitos. ‘‘Dentro do contexto escolar é um grande desafio’’, aponta. É preciso ainda corrigir erros históricos. ‘‘Nós saímos do processo de integração para o de inclusão através do Atendimento Educacional Especializado (AEE)’’.
Não basta que o aluno com algum tipo de necessidade especial esteja na escola, é preciso que toda a escola esteja preparada para recebê-lo com dignidade. ‘‘Nas décadas de 60, 70 ou até início de 80, a criança entrava na escola, mas a escola não se abria para essa criança’’, considera Laura.
A coordenadora recorda de que forma as criança com necessidades especiais eram recebidas no ambiente escolar. ‘‘Tinha aquelas salas especiais lá no canto da escola, muitas vezes escondida atrás da quadra de esportes. Era um espaço segregador. A política pública mudou e estamos trabalhando com o processo inclusivo’’, afirma.
Laura aponta os avanços na educação especial nos últimos anos. Entre elas está a oferta de capacitação para os professores através da Escola de Governo. ‘‘Estamos com uma formação continuada diferente porque esse governo oportunizou vários cursos online tanto a nível de aperfeiçoamento quando de graduação e a Seduc estimulou os professores do AEE a participarem’’, afirma.
“Rondônia não tinha esses profissionais e hoje em dia a gente já tem. É uma conquista. Nesse governo nós tivemos a contratação do primeiro revisor cego e do primeiro professor de libras surdo, e agora o objetivo é está aumentando esse quantitativo’’, Laura Dantas – coordenadora de Educação Especial
Quando o aluno chega à escola, segundo a coordenadora, é feito um estudo de caso para saber como é o processo de aprendizagem dele para então ofertar o que for preciso para garantir esse processo educacional preservando todos os direitos desse aluno. É nesse estudo de caso que é identificada a necessidade de cuidadores, intérpretes de libras e revisores cegos.
A contratação desses profissionais é apontada como outro avanço. ‘‘A Seduc sempre está ofertando vagas através de concursos públicos tanto emergenciais quanto efetivas. Rondônia não tinha esses profissionais e hoje em dia a gente já tem. É uma conquista. Nesse governo nós tivemos a contratação do primeiro revisor cego e do primeiro professor de libras surdo, e agora o objetivo é está aumentando esse quantitativo’’, aponta.
Recentemente o governo publicou edital para a contração de 206 técnicos educacionais sendo 58 interpretes de libras, dois revisores cegos e nove cuidadores.
Conquistas que vieram para consolidar a inclusão no estado de Rondônia. ‘‘Eu acredito que daqui há oito anos nós teremos cidadãos rondonienses com outro olhar, um olhar mais inclusivo, de respeito, de solidariedade. Onde tem uma criança com necessidade especial como estudante, ali tem uma oportunidade de crescimento de valores éticos e morais bem mais fortes’’.
Para ela, com essa política de inclusão, os estudantes vão aprender a aceitar as diferenças. ‘‘Vão querer aprender o braile para conversar com o amigo cego. Vãos sentir necessidade de aprender libras para trocar ideias com o colega surdo’’.
A ideia é que a inclusão transpasse as fronteiras da escola. Que essas crianças e jovens desenvolvam um olhar diferenciado. E isso reflita em profissionais que se importe com as necessidades do outro. Um arquiteto que inclua a acessibilidade no seu projeto. Um médico que conheça libras. Projeções que podem ser alcançadas se todos se conscientizarem de que inclusão é o caminho para que a escolas, as cidades, a sociedade seja realmente para todos.