Jornal O ESTADO DE SÃO PAULO – 23/11/15
Por FAUSTO MACEDO, JULIA AFFONSO e MATEUS COUTINHO
O juiz Jayme Martins de Oliveira Neto, reeleito presidente da Associação Paulista de Magistrados, neste sábado, 21,, pela chapa única ‘Apamagis Forte’, afirma que a ‘corrupção é questão de formação moral, de um lado, e de efetividade das leis e da Justiça, por outro’. Para ele, ‘o combate à corrupção começa em casa, na educação que se dá aos filhos, na valorização do respeito ao outro, na cultura da fraternidade, da solidariedade…’.
Jayme Martins de Oliveira Neto avalia que a solução para a enxurrada de 100 milhões de ações que travam os tribunais está ‘na tomada de consciência daqueles que detêm o poder estatal’. “Todos sabem que o sistema recursal vigente no país é absurdo, feito para as demandas não terminarem. Os grandes litigantes são conhecidos e o Estado é um deles e nada se faz em relação a isso”, atesta o magistrado.
O presidente reeleito da maior e mais importante entidade de classe estadual dos juízes considera que ‘os Juizados Especiais precisam retomar seu protagonismo e sua destinação histórica, pois foram atropelados pela estrutura burocrática’.
Indagado se, como cidadão, considera que o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) deve renunciar à presidência da Câmara, o magistrado disse que ‘a renúncia é um ato de vontade interna, pessoal’.
Estadão: O Brasil conta 100 milhões de processos nos tribunais. Que solução o sr vê para esse quadro?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: A partir de 1988, com a abertura democrática e a nova Constituição, surgiu uma consciência popular de defesa dos direitos e o Judiciário foi descoberto pelo povo. Isso revela confiança na Justiça; mas o Judiciário não estava preparado para esse volume de processos e o que se percebe a cada ano é um aumento no estoque. Ocorre que 100 milhões de processo não podem ser vistos apenas como números, afinal são 100 milhões de conflitos, de desavenças, desajustes no meio social. E essas 100 milhões ou mais de pessoas esperam uma decisão justa, proferida por um juiz isento, preparado, dedicado e que lhe dê um mínimo de atenção.
A solução passa por uma tomada de consciência daqueles que detêm o poder estatal. Todos sabem que o sistema recursal vigente no país é absurdo, feito para as demandas não terminarem. Os grandes litigantes são conhecidos e o Estado é um deles e nada se faz em relação a isso. Os Juizados Especiais precisam retomar seu protagonismo e sua destinação histórica, pois foram atropelados pela estrutura burocrática. A mediação e a conciliação precisam assumir verdadeiro papel de destaque.
Estadão: O Estado é o grande litigante que trava os tribunais. Como contê-lo?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: O Estado se utiliza da burocracia judicial. A cada ano, milhões de processos são despejados no Judiciário pelo Executivo. E ninguém quer discutir isso em profundidade. Modelos mentais do século passado e que nos formaram nas universidades impedem soluções novas, criativas. O homem é conservador por natureza e tem medo de mudanças. Sem que prefeitos, governadores e presidentes enfrentem a questão nada mudará. A mediação e a conciliação precisam ser absorvidas sem medo também na seara do direito público. O Judiciário não pode ser mais o cobrador do Poder Executivo e a execução fiscal deve tramitar no próprio Executivo, ao menos até a penhora. O juiz somente deve ser chamado para resolver o conflito. E as decisões precisam de efetividade. Com esse número de recursos e com a cultura de que o Estado tem de recorrer sempre, o quadro não mudará.
Estadão: Qual sua meta principal pelos juízes?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Trabalhar cada vez mais pelo aprimoramento do Poder Judiciário, nos limites de atuação de uma associação. Queremos um Judiciário mais forte e independente, que trabalhe com um volume de processos razoável. Nenhum juiz está feliz com o quadro atual, pois nossa destinação é servir ao povo, distribuir justiça nos limites da nossa consciência e formação. Queremos ouvir as partes, os advogados, queremos pacificar litigantes, julgar com rapidez. Mas como? Não há mágica. Os servidores estão esgotados, a estrutura é precária, a legislação muda sem maiores reflexões e há um limite humano para o trabalho. Então nosso papel é dialogar com os poderes constituídos e buscar soluções.
O Poder Judiciário dos Estados é o que tem a maior carga de processos e para isso basta olhar as estatísticas do CNJ. Para além do número de processos, os juízes realizam milhões de audiências anualmente e isso não é considerado ou contabilizado. Os governantes precisam respeitar o pacto federativo e valorizar os Tribunais de Justiça que não podem ser meros tribunais de passagem de autos.
Na Justiça dos Estados temos as competências que dizem mais de perto com a vida da população São as questões de família, os crimes contra a vida e o patrimônio, a delinquência juvenil, a defesa do consumidor, entre tantas outras que dizem diretamente com a vida das pessoas e por isso é preciso valorizar esse trabalho, essa Justiça Estadual. Não há justiça que preserve mais os direitos humanos que a Justiça dos Estados. E por essa razão que temos buscado diálogo com o executivo e o legislativo estadual pois sem que eles tomem consciência dessa realidade dificilmente o Judiciário, sozinho, ou suas associações, terão êxito nas iniciativas.
Estadão: O país vive uma crise moral sem precedentes. Como barrar a corrupção?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Corrupção é questão de formação moral, de um lado, e de efetividade das leis e da Justiça, por outro. Portanto, o combate à corrupção começa em casa, na educação que se dá aos filhos, na valorização do respeito ao outro, na cultura da fraternidade, da solidariedade. Passa pela escola, na forma como os professores tratam seus alunos e continua, dia a dia, nas relações humanas que se formam no trabalho, nos clubes, nos grupos etc. E, se tudo isso não funcionar, deve existir uma boa legislação que valorize o ser humano em todas as suas dimensões e que seja aplicada com efetividade, de maneira que a pessoa saiba, em violando o direito do outro segundo a lei local, que haverá repreensão do sistema judiciário.
Sem esses ingredientes não se barra a corrupção. Se falhar a educação no lar, na escola e na vida, não pode falhar a pedagogia da Justiça Estatal. O que se vê, no Brasil de hoje e em muitos lugares, é a mais absoluta falta de efetividade do sistema Judicial, pelo excesso de leis, de recursos, que favorece o advogado mais bem preparado e não o sistema de Justiça. Por isso, quando um juiz tem a oportunidade de mostrar efetividade e encontra ressonância nas instâncias superiores torna-se um mito, quase um herói.
Estadão: Faltam leis mais duras para os fraudadores do Tesouro? Qual a saída?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Precisamos de boas leis e de sanções efetivas. Fundamental priorizar os julgamentos dos crimes contra a administração pública, das ações de improbidade administrativa e de todas as que visem apurar desvio de recursos públicos. Enquanto os fraudadores do tesouro souberem que as ações não terminam, enquanto puderem utilizar de estratégias para ganhar tempo, cavar prescrição, enfim, pouca coisa mudará. Nós poderíamos, no Judiciário, de plano, priorizar esses julgamentos tanto na primeira quanto na segunda instância, criar câmaras especiais, de maneira a punir rápida e efetivamente o fraudador, e livrar o inocente, também rapidamente, quando o for o caso.
Estadão: Em sua opinião como cidadão, o presidente da Câmara dos Deputados deve renunciar?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Muito difícil opinar sem conhecer os fatos, os processos, as provas. A renúncia é um ato de vontade interna, pessoal. Para nós, o relevante é que as instituições funcionem, que os procedimentos de apuração sejam realizados, que o direito de ampla defesa e contradit
[third_paragraph] Left Side Content [/third_paragraph][third_paragraph] Middle Content [/third_paragraph][third_paragraph] Right Side Content [/third_paragraph]
ório seja respeitado e que a decisão administrativa ou judicial seja baseada no que for apurado nesses autos. Em assim ocorrendo, o Brasil superará a crise e as Instituições sairão fortalecidas.
O juiz Jayme Martins de Oliveira Neto, reeleito presidente da Associação Paulista de Magistrados, neste sábado, 21,, pela chapa única ‘Apamagis Forte’, afirma que a ‘corrupção é questão de formação moral, de um lado, e de efetividade das leis e da Justiça, por outro’. Para ele, ‘o combate à corrupção começa em casa, na educação que se dá aos filhos, na valorização do respeito ao outro, na cultura da fraternidade, da solidariedade…’.
Jayme Martins de Oliveira Neto avalia que a solução para a enxurrada de 100 milhões de ações que travam os tribunais está ‘na tomada de consciência daqueles que detêm o poder estatal’. “Todos sabem que o sistema recursal vigente no país é absurdo, feito para as demandas não terminarem. Os grandes litigantes são conhecidos e o Estado é um deles e nada se faz em relação a isso”, atesta o magistrado.
O presidente reeleito da maior e mais importante entidade de classe estadual dos juízes considera que ‘os Juizados Especiais precisam retomar seu protagonismo e sua destinação histórica, pois foram atropelados pela estrutura burocrática’.
Indagado se, como cidadão, considera que o deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ) deve renunciar à presidência da Câmara, o magistrado disse que ‘a renúncia é um ato de vontade interna, pessoal’.
Estadão: O Brasil conta 100 milhões de processos nos tribunais. Que solução o sr vê para esse quadro?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: A partir de 1988, com a abertura democrática e a nova Constituição, surgiu uma consciência popular de defesa dos direitos e o Judiciário foi descoberto pelo povo. Isso revela confiança na Justiça; mas o Judiciário não estava preparado para esse volume de processos e o que se percebe a cada ano é um aumento no estoque. Ocorre que 100 milhões de processo não podem ser vistos apenas como números, afinal são 100 milhões de conflitos, de desavenças, desajustes no meio social. E essas 100 milhões ou mais de pessoas esperam uma decisão justa, proferida por um juiz isento, preparado, dedicado e que lhe dê um mínimo de atenção.
A solução passa por uma tomada de consciência daqueles que detêm o poder estatal. Todos sabem que o sistema recursal vigente no país é absurdo, feito para as demandas não terminarem. Os grandes litigantes são conhecidos e o Estado é um deles e nada se faz em relação a isso. Os Juizados Especiais precisam retomar seu protagonismo e sua destinação histórica, pois foram atropelados pela estrutura burocrática. A mediação e a conciliação precisam assumir verdadeiro papel de destaque.
Estadão: O Estado é o grande litigante que trava os tribunais. Como contê-lo?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: O Estado se utiliza da burocracia judicial. A cada ano, milhões de processos são despejados no Judiciário pelo Executivo. E ninguém quer discutir isso em profundidade. Modelos mentais do século passado e que nos formaram nas universidades impedem soluções novas, criativas. O homem é conservador por natureza e tem medo de mudanças. Sem que prefeitos, governadores e presidentes enfrentem a questão nada mudará. A mediação e a conciliação precisam ser absorvidas sem medo também na seara do direito público. O Judiciário não pode ser mais o cobrador do Poder Executivo e a execução fiscal deve tramitar no próprio Executivo, ao menos até a penhora. O juiz somente deve ser chamado para resolver o conflito. E as decisões precisam de efetividade. Com esse número de recursos e com a cultura de que o Estado tem de recorrer sempre, o quadro não mudará.
Estadão: Qual sua meta principal pelos juízes?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Trabalhar cada vez mais pelo aprimoramento do Poder Judiciário, nos limites de atuação de uma associação. Queremos um Judiciário mais forte e independente, que trabalhe com um volume de processos razoável. Nenhum juiz está feliz com o quadro atual, pois nossa destinação é servir ao povo, distribuir justiça nos limites da nossa consciência e formação. Queremos ouvir as partes, os advogados, queremos pacificar litigantes, julgar com rapidez. Mas como? Não há mágica. Os servidores estão esgotados, a estrutura é precária, a legislação muda sem maiores reflexões e há um limite humano para o trabalho. Então nosso papel é dialogar com os poderes constituídos e buscar soluções.
O Poder Judiciário dos Estados é o que tem a maior carga de processos e para isso basta olhar as estatísticas do CNJ. Para além do número de processos, os juízes realizam milhões de audiências anualmente e isso não é considerado ou contabilizado. Os governantes precisam respeitar o pacto federativo e valorizar os Tribunais de Justiça que não podem ser meros tribunais de passagem de autos.
Na Justiça dos Estados temos as competências que dizem mais de perto com a vida da população São as questões de família, os crimes contra a vida e o patrimônio, a delinquência juvenil, a defesa do consumidor, entre tantas outras que dizem diretamente com a vida das pessoas e por isso é preciso valorizar esse trabalho, essa Justiça Estadual. Não há justiça que preserve mais os direitos humanos que a Justiça dos Estados. E por essa razão que temos buscado diálogo com o executivo e o legislativo estadual pois sem que eles tomem consciência dessa realidade dificilmente o Judiciário, sozinho, ou suas associações, terão êxito nas iniciativas.
Estadão: O país vive uma crise moral sem precedentes. Como barrar a corrupção?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Corrupção é questão de formação moral, de um lado, e de efetividade das leis e da Justiça, por outro. Portanto, o combate à corrupção começa em casa, na educação que se dá aos filhos, na valorização do respeito ao outro, na cultura da fraternidade, da solidariedade. Passa pela escola, na forma como os professores tratam seus alunos e continua, dia a dia, nas relações humanas que se formam no trabalho, nos clubes, nos grupos etc. E, se tudo isso não funcionar, deve existir uma boa legislação que valorize o ser humano em todas as suas dimensões e que seja aplicada com efetividade, de maneira que a pessoa saiba, em violando o direito do outro segundo a lei local, que haverá repreensão do sistema judiciário.
Sem esses ingredientes não se barra a corrupção. Se falhar a educação no lar, na escola e na vida, não pode falhar a pedagogia da Justiça Estatal. O que se vê, no Brasil de hoje e em muitos lugares, é a mais absoluta falta de efetividade do sistema Judicial, pelo excesso de leis, de recursos, que favorece o advogado mais bem preparado e não o sistema de Justiça. Por isso, quando um juiz tem a oportunidade de mostrar efetividade e encontra ressonância nas instâncias superiores torna-se um mito, quase um herói.
Estadão: Faltam leis mais duras para os fraudadores do Tesouro? Qual a saída?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Precisamos de boas leis e de sanções efetivas. Fundamental priorizar os julgamentos dos crimes contra a administração pública, das ações de improbidade administrativa e de todas as que visem apurar desvio de recursos públicos. Enquanto os fraudadores do tesouro souberem que as ações não terminam, enquanto puderem utilizar de estratégias para ganhar tempo, cavar prescrição, enfim, pouca coisa mudará. Nós poderíamos, no Judiciário, de plano, priorizar esses julgamentos tanto na primeira quanto na segunda instância, criar câmaras especiais, de maneira a punir rápida e efetivamente o fraudador, e livrar o inocente, também rapidamente, quando o for o caso.
Estadão: Em sua opinião como cidadão, o presidente da Câmara dos Deputados deve renunciar?
Juiz Jayme Martins de Oliveira Neto: Muito difícil opinar sem conhecer os fatos, os processos, as provas. A renúncia é um ato de vontade interna, pessoal. Para nós, o relevante é que as instituições funcionem, que os procedimentos de apuração sejam realizados, que o direito de ampla defesa e contraditório seja respeitado e que a decisão administrativa ou judicial seja baseada no que for apurado nesses autos. Em assim ocorrendo, o Brasil superará a crise e as Instituições sairão fortalecidas.