De mais de 300 mil casos para menos de 4,5 mil, Rondônia reduz índice de malária tendo a pesquisa como fator estratégico

diretor-cecom.jpg

Rondônia chegou a ser responsável por metade dos casos da malária no país no final da década de 80 e por 25% nas Américas com o registro de 300 mil casos. A doença que ainda desafia o mundo, mobiliza pesquisadores e explodiu em Rondônia, hoje encontra-se muito mais ‘tranquila’ para os rondonienses. De janeiro a agosto deste ano foram notificados apenas 4.382 casos.

O levantamento é do Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica – Malária (Sivep–Malária) da Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde (SVS/MS) com dados atualizados em 14 de setembro e sujeito a alterações. Três municípios concentram 75% dos casos da doença. São eles Porto Velho (1.938), Candeias do Jamari (947) e Machadinho do Oeste (417).

Também registram casos da doença os municípios de Alta Floresta do Oeste (9), Alto Alegre dos Parecis (4), Alto Paraíso (82); Alvorada do Oeste (16); Ariquemes (236); Buritis (45); Cabixi (1); Cacaulândia (1); Cacoal (7); Campo Novo de Rondônia (2); Cerejeiras (1); Costa Marques (12); Cujubim (133); Guajará-Mirim (158); Itapuã do Oeste (122); Jaru (20); Ji-Paraná (31); Mirante da Serra (10); Monte Negro (7).

E ainda Nova Brasilândia do ‘Oeste (5); Nova Mamoré; (32); Nova União; (4); Ouro Preto do Oeste (24); Pimenta Bueno (10); Pimenteiras do Oeste (1); Presidente Médici (6); Rio Crespo (18); Rolim de Moura (9); Santa Luzia D’Oeste (1); São Francisco do Guaporé (1); São Miguel do Guaporé (4); Theobroma (15); Urupá (10); Vale do Anari (18); Vale do Paraíso (3) e Vilhena (22).

Dos sete estados da região Norte, Rondônia ocupa o 6º lugar entre os que concentram mais casos, apenas o Tocantins conseguiu um resultado melhor. É no Amazonas, Acre e Pará que a malária tem feito mais vítimas. A malária é endêmica na Amazônia. A região concentra 99% dos casos da doença do país.

Esse cenário mais favorável no controle da malária em Rondônia é resultado de um esforço conjunto onde às pesquisas em ciência e tecnologia em saúde ocupam papel fundamental para o combate e controle da doença.

O Centro de Pesquisa em Medicina Tropical (Cepem/Sesau), que está localizado em Porto Velho em uma área do Centro de Medicina Tropical de Rondônia (Cemetron), acompanha o controle da malária em Rondônia há décadas, ainda quando era Centro de Pesquisa em Malária do Vale do Guaporé, localizado em Costa Marques.

‘‘Foram estudados todos os parâmetros de epidemiologia e entre o final dos anos 80 e início da década de 90 o Cepem, juntamente com a Universidade de Brasília e outras instituições nacionais, testou a primeira vacina contra malária do cientista colombiano Manuel Elkin Patarroyo, e se provou que a vacina não tinha os efeitos desejados’’, relembra o diretor do Cepem, médico e pesquisador Mauro Tada.

A partir daí os esforços se concentram na área terapêutica e controle vetorial. ‘‘A malária é o carro-chefe das pesquisas do Cepem, que faz parte da Comissão Nacional para o Controle da malária criado pelo Ministério da Saúde. Isso faz com que a gente tenha um certo peso nas decisões que se tomam no país em relação a terapêutica e condutas de controle da doença’’, considera.

Com pesquisas básicas e práticas e também os ensaios clínicos, o Cepem tem dado importantes contribuições para o controle da malária em Rondônia. ‘‘A partir do momento que a gente avança com pesquisas multicêntricas com o Pará e o Amazonas, por exemplo, a gente percebe qual o melhor tratamento para a malária. Inclusive no próximo ano o tratamento da malária falciparum deve mudar’’, revela.

Além de alertar quando um tratamento já não está sendo eficiente, o Cepem também busca novos medicamentos. ‘‘Através do Polo [de referência em Pesquisa, Formação, Desenvolvimento, Inovação e Difusão em Saúde (PID) no estado de Rondônia], pesquisadores estão buscando plantas medicinais que têm uma eficácia no tratamento da malária’’, destaca.

Também há uma preocupação de eliminar os gargalos no controle da malária. Um deles a interrupção do tratamento. ‘‘Nesse sentido, o Dr. Dhélio Pereira está a frentes de testes de medicamento que são usados fora do país, mas ainda não no Brasil, para verificar a possibilidade de substituição de algumas medicações como a primaquina pela tafenoquina. A primaquina você tem que tratar em sete dias dose dubla ou 14 dias dose simples. A Tafenoquina é dose única. A vantagem é ter a certeza que o paciente tomou o remédio, porque a maioria toma somente os primeiros dias e depois para e aí vem à recaída’’, explica.

DA EXPLOSÃO AO CONTROLE

E é assim, de pesquisa em pesquisa, que Rondônia deixa para traz o caos que viveu no auge dos casos de malária. De acordo com o diretor do Cepem, migração, intensa atividade garimpeira e avanço sobre áreas florestais potencializava nas décadas de 70, 80 e início dos anos 90 a transmissão da malária no Estado.

‘‘Todas as questões envolvendo malária sempre seguiram as migrações em regiões endêmicas. Então em Rondônia, a partir da década de 70, quando o governo federal abriu fronteiras na região amazônica, teve a chegada de pessoas que nunca tinham tido a doença, e houve esse surto de malária’’, relembra Tada.

Segundo o diretor, neste período havia uma mobilização mundial para erradicação da malária. As principais estratégias de combate era um tipo de medicamento que curava todos os tipos de malária e inseticida. ‘‘A Organização Mundial da Saúde acreditava que essas duas ‘armas’ iriam erradicar a malária no mundo, como aconteceu com a varíola, por exemplo, onde a vacinação resolveu. Mas em 1992 ficou decido, em uma reunião em Amsterdã, que não havia mais possibilidade para erradicação e sim para o controle da malária’’, conta.

Dava início aí ao Programa de Controle da Malária no mundo que persiste até hoje. ‘‘As ações passaram a ser focadas no tratamento do paciente e fazendo bloqueio de transmissão. A ideia é chegar ao um menor tempo de tratamento para controlar a malária’’, explica Tada. E em novembro de 2015, o Brasil definiu um novo programa com o objetivo de eliminar a malária falciparum, o tipo mais letal.

De acordo com o diretor do Cepem, a malária falciparum chegou a muitas regiões aos menores patamares já registrados. ‘‘Nas regiões que a malária é residual a probabilidade de eliminar é muito grande’’, aponta Tada. Em Rondônia, os tipos de malária predominantes são vivax e falciparum.

O Cepem começa a investigar os gargalos para a eliminação da malária falciparum, como a transmissão da doença em populações flutuantes, a exemplo dos garimpos.

Mas para o médico pesquisador, o maior problema do Brasil hoje é a malária vivax.  ‘‘A malária vivax no seu ciclo tem uma possibilidade de transmissão muito mais rápida que a falciparum e desenvolve em seu ciclo fatores que impede ou dificulta o controle dela. Uma delas são as chamadas recaídas que ajudam na disseminação e expansão da doença. Um único caso pode ocasionar um surto enorme’’, revela.

Segundo Tada, nos últimos anos foram registradas muitas mortes em decorrência da malária vivax. A doença por si só, tratando, não é letal como a falciparum, mas associada a outras se torna grave como, por exemplo, a combinação dengue com malária vivax. Diferente da falciparum, na vivax, mesmo tratada, persiste uma forma que permanece no fígado, chamada hipnozoíta, e que depois meses reaparece na forma sanguínea.

O Cepem trabalha para eliminação da malária vivax. Segundo Mauro Tada, a ideia é focar nos municípios com malária residual. ‘‘Temos que inovar na eliminação dessa malária que tem pontos bem definidos. Podemos bloquear a área e tratar a todos ou fazer o exame em todos e quem tiver positivo tratar’’, explica.

Esforços como esses, em pesquisas e busca de soluções para frear os casos de malária, têm levado o estado de Rondônia a ser reconhecido dentro e fora do país. Inclusive na semana, passada a convite da Secretaria Municipal de Saúde de Joinville, o diretor do Cepem compartilhou as experiências adquiridas em Rondônia na palestra ‘‘Aspectos epidemiológicos, clínicos e laboratoriais da malária’’.

A malária ainda deixa Rondônia, o Brasil e o mundo em alerta, requer uma mobilização conjunta para alcançar resultados melhores e a pesquisa é ferramenta estratégica para os avanços no enfrentamento a doença.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

verificação *

scroll to top