Cunha está preso desde 19 de outubro do ano passado
O deputado federal cassado e ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDBRJ) foi condenado nesta quinta-feira (30) a 15 anos e quatro meses de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. A decisão é do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Moro, responsável pela Operação Lava Jato na primeira instância. Cunha está preso desde 19 de outubro do ano passado no âmbito da Lava Jato e, atualmente, está no Complexo Médico-Penal em Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. Após denúncia do MPF (Ministério Público Federal), o ex-deputado recebeu condenação por corrupção passiva por conta de solicitação e recebimento de vantagem indevida no contrato de exploração de petróleo em Benin; três condenações por lavagem de dinheiro; e 14 por evasão de divisas. Essa é a primeira condenação do peemedebista na Lava Jato. A defesa de Cunha informou que vai recorrer da sentença ao TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), em Porto Alegre. Moro defendeu a denúncia do MPF ao afirmar que ela “não é inepta, como alega a defesa”. “Descreve ela adequadamente as condutas delitivas de corrupção e lavagem de dinheiro”, escreveu o juiz. Na decisão, o magistrado considerou ainda que Cunha tem “bons antecedentes”, já que essa é a primeira condenação dele. O peemedebista “responde a outras ações penais [uma na 10ª Vara Criminal Federal de Brasília e outra no Supremo Tribunal Federal], mas não foi ainda por elas julgado. Então será considerado como tendo bons antecedentes”, ressalvou o juiz. Mas completou: “Considerando as regras do artigo 33 do Código Penal, fixo o regime fechado para o início de cumprimento da pena. A progressão de regime para a pena de corrupção fica, em princípio, condicionada à efetiva devolução do produto do crime, no caso a vantagem indevida recebida, nos termos do artigo 33, parágrafo 4º, do Código Penal.”
Cunha recebeu US$ 1,5 milhão de propina, diz Moro sobre os crimes, o juiz apontou que a prática do crime de corrupção envolveu o recebimento de cerca de US$ 1,5 milhão, “considerando a parte por ele recebida, o que é um valor bastante expressivo”. O pagamento estava ligado à compra do bloco 4 em Benin. “Consequências também devem ser valoradas negativamente, pois os vícios procedimentais na aquisição geraram um prejuízo estimado à Petrobras de cerca de US$ 77,5 milhões de dólares”, escreveu. “A corrupção com pagamento de propina de US$ 1,5 milhão e tendo por consequência prejuízo ainda superior aos cofres públicos merece reprovação especial. A culpabilidade é elevada”, justificou o magistrado, lembrando que Cunha recebeu vantagem indevida no exercício do mandato de deputado federal, em 2011. “A responsabilidade de um parlamentar federal é enorme e, por conseguinte, também a sua culpabilidade quando pratica crimes. Não pode haver ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele deposita para obter ganho próprio”, escreveu o juiz na decisão. Por esses pontos e pela “prática de atos de ofício com infração do dever funcional”, Moro decidiu pela pena de quatro anos e seis meses de prisão pelo crime de corrupção passiva. A respeito da evasão de divisão, Moro condenou Cunha por “condutas delitivas” ocorridas entre 2007 e 2014, quando ele era deputado federal. A pena, neste caso, foi definida em três anos e seis meses de reclusão. Cunha agiu com “grau de sofisticação”, diz juiz Sobre o crime de lavagem, o juiz aponta que ela envolveu especial sofisticação, “com a utilização de não uma, mas duas contas secretas no exterior, em nome de ‘trusts’ diferentes, com transações entre elas”. “Tal grau de sofisticação não é inerente ao crime de lavagem e deve ser valorado negativamente a título de circunstâncias”. Na decisão, Moro diz que a lavagem envolveu cerca de US$ 1,5 milhão. Foram verificadas condutas de ocultação e dissimulação entre 2011 e 2014, durante o exercício do cargo de deputado federal. Por isso, o juiz decidiu que sua pena, por esse crime, deveria ser de cinco anos e dez meses de prisão. Moro homenageia Teori e apela ao Congresso contra lei do abuso de autoridade O magistrado ainda criticou a lei de abuso de autoridade e lembrou o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Teori Zavascki, morto em janeiro em um acidente aéreo. O juiz mencionou que a sentença de hoje e a prisão de Cunha “constituem apenas mais uma etapa de um trabalho que foi iniciado e conduzido pelo eminente ministro Teori Zavascki”. “Não há melhor momento para recordar o legado de independência do Ministro Teori Zavascki do que agora, quando se discute a aprovação de nova lei de abuso de autoridade que, sem as salvaguardas necessárias, terá o efeito prático de criminalizar a interpretação da lei e com isso colocará em risco a independência judicial, subordinando-a ao interesse dos poderosos”, disse o juiz. Moro faz ainda um apelo ao Congresso: “Espera-se e confia-se que o Congresso saberá proceder com sabedoria para a adoção de salvaguardas explícitas e inequívocas”.
Sobre Teori, Moro lembrou que, “apesar do mérito institucional e coletivo da Procuradoria Geral da República, do Egrégio Supremo Tribunal Federal e, posteriormente, da própria Câmara dos Deputados”, é “necessário destacar o trabalho individual do eminente e saudoso ministro Teori Zavascki, relator da aludida ação cautelar. Por essa decisão e por outras, o legado de independência e de seriedade do ministro Teori Zavascki não será esquecido.”
Cunha teria tentado “constranger” Temer ainda que não nominalmente, o presidente Michel Temer (PMDB) foi mencionado na sentença como quem teria sofrido tentativa de intimidação por parte do deputado cassado –mesmo Cunha na condição de preso. Nem mesmo a prisão, destacou o juiz, “o impediu de prosseguir com o mesmo modus operandi” de “extorsão, ameaça e intimidações.”
“A pretexto de instruir a ação penal, Eduardo Cosentino da Cunha apresentou vários quesitos dirigidos ao Exmo. Sr. Presidente da República que nada diziam respeito ao caso concreto”, diz a sentença, segundo a qual “tais quesitos, absolutamente estranhos ao objeto da ação penal, tinham por motivo óbvio constranger” o presidente “e provavelmente buscavam com isso provocar alguma espécie intervenção indevida da parte dele em favor do preso, o que não ocorreu.”