A voracidade dos juízes

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Diante da crise econômica, a pretensão desses grêmios da magistratura é, mais do que despropositada, aviltante.

Estimulados pela decisão do Conselho Superior do Ministério Público de incluir no orçamento de 2018 um reajuste de 16,7% nos salários dos procuradores da República, os presidentes da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), da Associação dos Juízes Federais (Ajufe) e da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra) reuniram-se com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, para reivindicar aumento de 16,3%. Além disso, pediram uma reunião com o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES), relator de um projeto de lei que prevê reajuste, no mesmo porcentual, para toda a magistratura.

Entre outros argumentos, os presidentes dessas associações alegam que, se outras categorias do funcionalismo público tiveram os vencimentos reajustados em 2016 e 2017, não é justo que a magistratura fique de fora. Também afirmam que, se os salários dos juízes não forem aumentados, eles passarão a receber menos do que consultores legislativos do Senado e da Câmara dos Deputados, auditores do Tribunal de Contas da União, Defensores Públicos, advogados da União e delegados da Polícia Federal. E isso comprometeria a hierarquia funcional da administração pública e o equilíbrio dos Poderes, afirmam os imaginosos dirigentes dessas entidades.

“Os associados me perguntam por que outras categorias tiveram reajuste e nós não. A crise econômica só vale para a magistratura?”, indaga o presidente da Ajufe, Roberto Veloso, depois de lembrar que as perdas acumuladas pelos juízes federais chegam a 41% e de justificar as férias de 60 dias a que os juízes federais têm direito – o dobro dos demais trabalhadores do País. Isso seria uma forma de compensar o fato de magistrados não terem direito a hora extra nem ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, explicou, esquecendo-se de que ele e seus colegas de toga jamais são ameaçados pelo desemprego.

Esses argumentos dão a medida do irrealismo de certos setores da magistratura, que jamais entenderam que os Poderes são três, mas o cofre é um só e a responsabilidade pelo equilíbrio fiscal é do Executivo. Com quase 14 mil integrantes, a magistratura é uma das categorias com os salários mais altos da administração pública. Mesmo assim, jamais deixou de imaginar subterfúgios legais para ganhar mais do que o teto do funcionalismo estabelecido pela Constituição, hoje de R$ 33.763. Graças a benefícios absurdos e imorais, como auxílio-aluguel e auxílio-creche, o salário médio dos juízes do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por exemplo, é de R$ 45,9 mil, como lembra a pesquisadora Luciana Cardoso em sua tese de doutorado recém-defendida na Fundação Getúlio Vargas. Ela também mostra que os juízes brasileiros ganham mais do que os juízes franceses, alemães, suecos, espanhóis e portugueses.

Diante da crise econômica, responsável por uma queda na arrecadação que vem comprometendo a oferta de serviços públicos essenciais para toda a população, a pretensão desses grêmios da magistratura é, mais do que despropositada, aviltante. Como o teto constitucional do funcionalismo é vinculado aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, um aumento de 16,3% pleiteado pelos juízes produziria um efeito cascata em toda a cúpula da administração pública, agravando ainda mais a crise fiscal.

Felizmente, alguns membros da mais alta Corte do País – à qual caberá discutir na próxima semana em sessão administrativa o reajuste pleiteado pelos juízes – têm consciência desse risco e já afirmaram que não apoiarão pretensões perdulárias. “Qualquer reajuste acarretará um desgaste incrível em termos institucionais. O momento é de extrema cautela, pois o País está numa situação delicada e precisamos colaborar para que saia dessa situação”, afirma o ministro Marco Aurélio. Por seu lado, a presidente do STF recebeu os presidentes das associações de juízes, mas sinalizou que também desaprova o pedido de reajuste. Resta esperar que os demais membros da Corte sejam igualmente sensatos.

Fonte: O Estado de S. Paulo

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