Ayahuasca estimula proliferação de neurônios, afirma estudo

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Cipó Banisteriopsis caapi utilizado pelos pajés na preparação da ayahuasca

Uma das principais substâncias presentes na ayahuasca, bebida usada há séculos em rituais religiosos da América do Sul, é capaz de estimular a proliferação de células do cérebro, mostram experimentos realizados por pesquisadores brasileiros.

O trabalho ainda está no começo, mas os resultados sugerem que os princípios ativos achados na bebida têm potencial para serem aplicados contra a depressão e outros tipos de problemas mentais.

A ayahuasca, cujo nome significa algo como “cipó dos espíritos” em quíchua, idioma dominante no antigo Império Inca, é feita de acordo com receitas tradicionais que podem variar bastante.

Apesar dessa grande variabilidade, seus principais componentes costumam ser o cipó Banisteriopsis caapi e a folha de Psychotria viridis, ambas plantas encontradas na Amazônia e utilizadas pelos pajés da região desde tempos imemoriais.

Os usuários da bebida, que hoje são não apenas indígenas como também membros de religiões relativamente recentes, como o Santo Daime e a União do Vegetal, frequentemente sofrem efeitos tanto físicos quanto psicológicos.

Além de episódios de vômitos e diarreia, o consumo da ayahuasca costuma induzir visões e experiências auditivas, assim como sensações de iluminação espiritual, forte alegria ou medo.

Nesse contexto ritual e religioso, o uso da ayahuasca é legal em diversos países, inclusive no Brasil.

PRIMEIRAS PISTAS

Alguns testes de pequena escala sugerem que o preparado amazônico pode ter rápido efeito positivo sobre pessoas com depressão, embora os estudos ainda sejam raros. Ao mesmo tempo, a molécula harmina, proveniente do cipó B. caapi e encontrada na circulação sanguínea das pessoas que ingerem a bebida, mostrou ter o mesmo efeito em camundongos com sintomas depressivos.

Isso chamou a atenção da equipe do novo estudo, liderada por Stevens Rehen, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e do Idor (Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino). Rehen e seus colegas estudam diversos aspectos da chamada neurogênese, o processo pelo qual certas células progenitoras dão origem aos neurônios e, portanto, às estruturas do cérebro. Em indivíduos adultos (tanto em humanos quanto em roedores), esse processo acontece principalmente em áreas especializadas do cérebro, como o hipocampo.

Ocorre que os medicamentos antidepressivos convencionais afetam de forma positiva justamente a neurogênese, que parece sofrer um baque durante a depressão.

Tentando unir as duas coisas, o novo estudo, que tem como primeira autora a doutoranda sérvia Vanja Dakic, da UFRJ, começou com a obtenção das chamadas hNPCs (células progenitoras neurais humanas), que estão na base do processo de neurogênese. É a partir delas que os diferentes tipos de células cerebrais vão se diferenciando.

As hNPCs foram incubadas por 96 horas com diferentes concentrações de harmina (veja infográfico). A substância não causou danos ao DNA das células progenitoras nem as levou à morte -muito pelo contrário: dependendo da concentração, o número de células capazes de proliferar aumentou em cerca de 60%.

Mais interessante ainda, também houve um aumento das projeções que aparecem nas células nervosas conforme elas vão se desenvolvendo. O formato de “árvore” dos neurônios, com “galhos” que se estendem e se subdividem, está diretamente relacionado às conexões que eles estabelecem com outros neurônios, as quais, por sua vez, são cruciais para o aprendizado e a formação de memórias.

Para os pesquisadores, vale a pena colocar a molécula derivada da ayahuasca entre os candidatos a futuras drogas contra a depressão. Para isso, é claro, mais estudos são indispensáveis. Também é importante ressaltar que não se pode garantir que o uso da bebida original terá o mesmo efeito, já que diversas moléculas interagem entre si no organismo das pessoas que ingerem o preparado.

Fonte: REINALDO JOSÉ LOPES – COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

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